Concessionária fica em Estrela, no Vale do Taquari (Foto: Luciane Kohlmann/RBS TV)
12/08/2013 06h05- Atualizado em 12/08/2013 10h05
Dono de 'revenda fantasma' preserva carros e vai ao trabalho todos os dias
Revenda de carros em Estrela segue conservada como se estivesse ativa.
Local virou espécie de museu particular, ainda com carros 0 km.
Fuscas 0 km estão entre as relíquias preservadas pelo dono da revenda (Foto: Luciane Kohlmann/RBS TV)
Em Estrela, no Vale do Taquari, a 115 km de Porto Alegre, fica uma concessionária que encerrou suas atividades há cerca de 10 anos. Aos olhos menos atentos, porém, o local parece estar em funcionamento. Pintura recente, plantas bem cuidadas, monitoramento por câmeras e quatro carros 0 km. São três Fuscas e um Santana nunca usados, raridades em meio a veículos rodados. É como se fosse uma viagem ao passado.
Ao chegar perto da vitrine da Comercial Gaúcha, um detalhe chama a atenção: os carros expostos não são mais fabricados. Conhecida como "concessionária fantasma", a loja pertence a Otmar Walter Essig, 79 anos. Discreto, não gosta de aparecer nem de dar entrevistas, mas abriu as portas de seu escritório para contar a história que muitos duvidam na cidade. É lá que seu Otmar ainda cumpre expediente diário, mesmo que não venda um carro há anos.
Em frente à porta da revenda, está estacionado um Santana GLS 2000, ano 1996, que é um dos veículos que ele dirige ultimamente. No escritório, dezenas de arquivos e documentos sobre peças, materiais e funcionários ainda estão alinhados em prateleiras. Uma coleção de chaveiros deixa um tom mais informal.
"Chego aqui todo dia às 6h15, 6h30, e tomo o meu chimarrão"
Otmar Essig
"Essa coleção era da Susi. Trouxe para cá para ficar mais perto de mim", conta ao G1 seu Otmar, referindo-se à mulher, que morreu há seis anos. Em uma caixa dos Correios em cima de um balcão, guarda fotos antigas da mulher e também de antigos carros da família, como o Karmann-Ghia. Religioso , montou uma pequena capela em um cantinho da sala e deixa a Bíblia sobre a mesa de trabalho, onde também descansa uma cuia de chimarrão."Chego aqui todo dia às 6h15, 6h30, e tomo o meu chimarrão. Às vezes, alguns amigos madrugadores vêm aqui também", explica. Otmar conta que a concessionária existe desde 1969. Na época, era um dos sócios, até assumir completamente a operação em 1974. Segundo ele, era uma revenda conceituada na região.
O problema começou no início dos anos 2000, quando a Volkwagen elevou a meta de vendas. Ele comercializava 25 carros por mês e teria de passar para 60, número "quase impossível", segundo ele. Foi quanto decidiu parar. Demitiu e indenizou todos os 33 funcionários e fez o desligamento com a montadora em 2004. Alguns dizem que foi no final da década de 90. O que é certo é que desde lá, nada mudou de lugar.
Variedade de raridades chama atenção
(Foto: Reprodução/RBS TV)
(Foto: Reprodução/RBS TV)
Orgulhoso com o que acabou se transformando em seu museu particular, Otmar mostra os carros que são de uso pessoal: um Fusca branco 86 totalmente original, uma Kombi pickup de 1994 e o esportivo SP2, ano 1975, que é o seu xodó. Os três automóveis estão em uma antiga garagem onde eram realizadas as revisões e os reparos. As ferramentas seguem organizadas na parede. A máquina do cartão-ponto parece à espera dos funcionários. Em um mezanino, é possível ver carcaças de carros antigos que, aos poucos, são consumidas pela ferrugem.
A concessionária ainda preserva carros 0 km que não são mais fabricados. No salão de exposições, um Fusca azul metálico, ano 86, motor 1.6, exibe a placa “última série”. O veículo nunca deixou o local, mas segue com a pintura brilhando. O modelo, que traz novos freios a disco para a época na dianteira e barra estabilizadora traseira redesenhada para uma melhor performance aerodinâmica, mantém o cheirinho de novo, mesmo passados 27 anos. Ao lado dele, está um Santana Quantum, ano 96, que preserva até os plásticos vindos de fábrica nos bancos e no piso.
Santana Quantum, ano 96, preserva até os plásticos vindos de fábrica nos bancos (Foto: Luciane Kohlmann/RBS TV)
Em uma sala fechada, longe de qualquer curioso, estão guardadas outras duas relíquias 0 km: dois fuscas cor prata, ano 96. São duas unidades da chamada “Série Ouro”, último lote de 1,5 mil veículos fabricados no Brasil. Neste modelo, a fábrica superequipou a versão, com estofamentos diferenciados, desembaçador traseiro, faróis de milha, painel com fundo branco, vidros verdes.
A prova de que as raridades nunca rodaram em um asfalto é a camada grossa de poeira que esconde a maior parte dos detalhes de luxo. Para completar, o descendente de alemães ainda preserva mais de 200 mil peças, a maioria de veículos das décadas de 80 e 90.
Fusca azul, ano 86, é preservado na revenda
(Foto: Luciane Kohlmann/RBS TV)
(Foto: Luciane Kohlmann/RBS TV)
No lado de fora, o clima é mesmo de concessionária abandonada. Há o espaço onde eram realizadas as lavagens e um pátio gigante sem qualquer vestígio de sujeira onde eram feitas chapeação e pintura. O terreno possui quase 5 mil metros quadrados.
Bem em frente está a oficina mecânica do Enio Schwingel, instalado no local há 23 anos. No passado, a Comercial Gaúcha era a sua principal fornecedora. Atualmente, precisa ir até outros municípios atrás de peças de reposição. O homem diz que ninguém entende por que o dono da revenda mantém há tanto tempo a rotina se a loja não funciona mais.
"Chego aqui às 7h e ele sempre já está na revenda com seu chimarrãozinho. A gente se pergunta por que um homem com uma idade já avançada mantém este patrimônio. Na verdade, a gente acha que é um hobby", especula Enio.
Quando questionado sobre o motivo de continuar repetindo a rotina há mais de 30 anos, Otmar Essig apenas diz que é o seu prazer, seu passatempo. "Tenho dinheiro suficiente para viver", conta. E assim, por volta das 16h, ele encerra o expediente particular e volta pra casa.
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